HANS CHRISTIAN ANDERSEN
A mamãe pata tinha
escolhido um lugar ideal para fazer seu ninho: um cantinho bem protegido no
meio da folhagem, perto do rio que contornava o velho castelo. Mais adiante se
estendiam o bosque e um lindo jardim florido.
Naquele lugar sossegado,
a pata agora aquecia pacientemente seus ovos. Por fim, após a longa espera, os
ovos se abriram um após o outro, e das cascas rompidas surgiram, engraçadinhos
e miúdos, os patinhos amarelos que, imediatamente, saltaram do ninho.
Porém um dos ovos ainda
não se abrira; era um ovo grande, e a pata pensou que não o chocara o suficiente.
Impaciente, deu umas bicadas no ovão e ele começou a se romper.
No entanto, em vez de um
patinho amarelinho, saiu uma ave cinzenta e desajeitada. Nem parecia um
patinho.
Para ter certeza de que o
recém-nascido era um patinho, e não outra ave, a mãe-pata foi com ele até o rio
e o obrigou a mergulhar junto com os outros.
Quando viu que ele nadava
com naturalidade e satisfação, suspirou aliviada. Era só um patinho muito,
muito feio. Tranquilizada, levou sua numerosa família para conhecer os outros
animais que viviam nos jardins do castelo.
Todos parabenizaram a
pata: a sua ninhada era realmente bonita. Exceto um. O horroroso e desajeitado
das penas cinzentas!
— É grande e sem graça! —
falou o peru.
— Tem um ar abobalhado —
comentaram as galinhas.
O porquinho nada disse,
mas grunhiu com ar de desaprovação.
Nos dias que se seguiram,
as coisas pioraram. Todos os bichos, inclusive os patinhos, perseguiam a
criaturinha feia. A pata, que no princípio defendia aquela sua estranha cria,
agora também sentia vergonha e não queria tê-lo em sua companhia.
O pobre patinho crescia
só, mal cuidado e desprezado. Sofria. As galinhas o bicavam a todo o instante,
os perus o perseguiam com ar ameaçador e até a empregada, que diariamente
levava comida aos bichos, só pensava em enxotá-lo.
Um dia, desesperado, o
patinho feio fugiu. Queria ficar longe de todos que o perseguiam.
Caminhou, caminhou e
chegou perto de um grande brejo, onde viviam alguns marrecos. Foi recebido com
indiferença: ninguém ligou para ele. Mas não foi maltratado nem ridicularizado;
para ele, que até agora só sofrera, isso já era o suficiente.
Infelizmente, a fase
tranquila não durou muito. Numa certa madrugada, a quietude do brejo foi
interrompida por um tumulto e vários disparos: tinham chegado os caçadores!
Muitos marrequinhos
perderam a vida. Por um milagre, o patinho feio conseguiu se salvar,
escondendo-se no meio da mata.
Depois disso, o brejo já
não oferecia segurança; por isso, assim que cessaram os disparos, o patinho
fugiu de lá.
Novamente caminhou,
caminhou, procurando um lugar onde não sofresse. Ao entardecer, chegou a uma
cabana.
A porta estava
entreaberta, e ele conseguiu entrar sem ser notado. Lá dentro, cansado e
tremendo de frio, encolheu-se num cantinho e logo dormiu.
Na cabana morava uma
velha, em companhia de um gato, especialista em caçar ratos, e de uma galinha,
que todos os dias botavam o seu ovinho. Na manhã seguinte, quando a dona da
cabana viu o patinho dormindo no canto, ficou toda contente.
— Talvez seja uma
patinha. Se for, cedo ou tarde botará ovos, e eu poderei preparar cremes,
pudins e tortas, pois terei mais ovos. Estou com muita sorte! Mas o tempo
passava, e nenhum ovo aparecia. A velha começou a per-
Der a paciência. A
galinha e o gato, que desde o começo não viam com bons olhos o recém-chegado,
foram ficando agressivos e briguentos.
Mais uma vez, o
coitadinho preferiu deixar a segurança da cabana e se aventurar pelo mundo.
Caminhou, caminhou e achou um lugar tranquilo perto de uma lagoa, onde parou.
Enquanto durou a boa
estação, o verão, as coisas não foram muito mal. O patinho passava boa parte do
tempo dentro da água e lá mesmo encontrava alimento suficiente.
Mas chegou o outono. As
folhas começaram a cair, bailando no ar e pousando no chão, formando um grande
tapete amarelo. O céu se cobriu de nuvens ameaçadoras e o vento esfriava cada
vez mais. Sozinho, triste e esfomeado, o patinho pensava preocupado, no inverno
que se aproximava.
Num final de tarde, viu
surgir entre os arbustos um bando de grandes e lindíssimas aves. Tinham as
plumas alvas, as asas grandes e um longo pescoço, delicado e sinuoso: eram
cisnes, emigrando na direção de regiões quentes. Lançando estranhos sons,
bateram as asas e levantaram voo, bem alto.
O patinho ficou
encantado, olhando a revoada, até que ela desaparecesse no horizonte. Sentiu
uma grande tristeza, como se tivesse perdido amigos muito queridos.
Com o coração apertado,
lançou-se na lagoa e nadou durante longo tempo. Não conseguia tirar o
pensamento daquelas maravilhosas criaturas, graciosas e elegantes. Foi se
sentindo mais feio, mais sozinho e mais infeliz do que nunca.
Naquele ano, o inverno
chegou cedo e foi muito rigoroso. O patinho feio precisava nadar
ininterruptamente, para que a água não congelasse em volta de seu corpo,
criando uma armadilha mortal. Mas era uma luta contínua e sem esperança. Um
dia, exausto, permaneceu imóvel por tempo suficiente para ficar com as patas
presas no gelo.
— Agora morrerei —
pensou. — Assim, terá fim todo meu sofrimento.
Fechou os olhos, e o
último pensamento que teve antes de cair num sono parecido com a morte foi para
as grandes aves brancas.
Na manhã seguinte, bem
cedo, um camponês que passava por aqueles lados viu o pobre patinho, já meio
morto de frio. Quebrou o gelo com um pedaço de pau, libertou o pobrezinho e
levou-o para sua casa.
Lá o patinho foi
alimentado e aquecido, recuperando um pouco de suas forças. Logo que deu sinais
de vida, os filhos do camponês se animaram:
— Vamos fazê-lo voar!
— Vamos escondê-lo em
algum lugar!
E seguravam o patinho,
apertavam-no, esfregavam-no. Os meninos não tinham más intenções; mas o
patinho, acostumado a ser maltratado, atormentado e ofendido, assustou-se e
tentou fugir. Fuga atrapalhada!
Caiu de cabeça num balde
cheio de leite e, esperneando para sair, derrubou tudo. A mulher do camponês
começou a gritar, e o pobre patinho se assustou ainda mais.
Acabou se enfiando no
balde da manteiga, engordurando-se até os olhos, e finalmente se enfiou num
saco de farinha, levantando uma poeira sem fim.
A cozinha parecia um
campo de batalha. Fora de si, a mulher do camponês pegara a vassoura e
procurava golpear o patinho. As crianças corriam atrás do coitadinho,
divertindo-se muito.
Meio cego pela farinha,
molhado de leite e engordurado de manteiga, esbarrando aqui e ali, o pobrezinho
por sorte conseguiu afinal encontrar a porta e fugir, escapando da curiosidade
das crianças e da fúria da mulher.
Ora esvoaçando, ora se
arrastando na neve, ele se afastou da casa do camponês e somente parou quando
lhe faltaram as forças.
Nos meses seguintes, o
patinho viveu num lago, abrigando-se do gelo onde encontrava relva seca.
Finalmente, a primavera
derrotou o inverno. Lá no alto, voavam muitas aves. Um dia, observando-as, o
patinho sentiu um inexplicável e incontrolável desejo de voar. Abriu as asas,
que tinham ficado grandes e robustas, e pairou no ar.
Voou. Voou. Voou
longamente, até que avistou um imenso jardim repleto de flores e de árvores; do
meio das árvores saíram três aves brancas.
O patinho reconheceu as
lindas aves que já vira antes e sentiu-se invadir por uma emoção estranha, como
se fosse um grande amor por elas.
— Quero me aproximar
dessas esplêndidas criaturas — murmurou. — Talvez me humilhem e me matem a
bicadas, mas não importa. É melhor morrer perto delas do que continuar vivendo
atormentado por todos.
Com um leve toque das
asas, abaixou-se até o pequeno lago e pousou tranquilamente na água.
— Podem matar-me, se
quiserem — disse resignado, o infeliz.
E abaixou a cabeça,
aguardando a morte. Ao fazer isso, viu a própria imagem refletida na água, e
seu coração entristecido deu um pulo. O que via não era a criatura
desengonçada, cinzenta e sem graça de outrora. Enxergava as penas brancas, as grandes
asas e um pescoço longo e sinuoso. Ele era um cisne! Um cisne, como as aves que
tanto admirava.
— Bem-vindo entre nós! —
disseram-lhe os três cisnes, curvando os pescoços, em sinal de saudação.
Aquele que num tempo
distante tinha sido um patinho feio, humilhado, desprezado e atormentado
sentia-se agora tão feliz que se perguntava se não era um sonho! Mas não! Não
estava sonhando. Nadava em companhia de outros, com o coração cheio de
felicidade.
Mais tarde, chegaram ao
jardim três meninos, para dar comida aos cisnes. O menorzinho disse surpreso:
— Tem um cisne novo! E é
o mais belo de todos! E correu para chamar os pais.
— É mesmo uma esplêndida
criatura! — disseram os pais.
E jogaram pedacinhos de
biscoito e de bolo. Tímido diante de tantos elogios, o cisne escondeu a cabeça
embaixo da asa.
Talvez um outro, em seu
lugar, tivesse ficado envaidecido. Mas não ele. Seu coração era muito bom, e
ele sofrera muito antes de alcançar a sonhada felicidade.